Sunday, March 8, 2009

Recordar é viver

Um texto antiiiiigo, mas absolutamente atual, em mim.

Insônia

Tenho tido dificuldades de dormir.
Tento todas as técnicas, mas diariamente tenho vivido a mesma coisa. É só deitar a cabeça no travesseiro que os problemas do dia começam a passear pela minha cabeça. Eu tento me livrar, mas eles insistem e, tranquilamente nadam - como peixes - no meu pensamento, bem na hora em que teria de esvaziar tudo...
Já me ensinaram a estratégia da bolha. Vou pondo cada problema dentro de uma bolha e visualizo a tal bolha saindo pela janela do quarto, devagar e, por fim, indo embora pelo céu. As vezes tento essa, mas passo horas até por cada item dentro de diferentes bolhas. Meu marido sugeriu que eu pusesse todos os problemas de uma vez, em uma única bolha, mas é super confuso. Ele sugeriu até que eles fizessem uma fila, como se fosse um check-in pra entrar na bolha, mas nem todos os problemas ou pessoas se conhecem, e, na fila, já tive muitos problemas de discussões, gente querendo passar na frente do outro, enfim, por isso são problemas.
Acabava passando as primeiras horas da minha noite arrumando as bolhas e inserindo cada pessoa, (ou problema) dentro de cada bolha. Já inseri até um prédio inteiro numa bolha uma vez. E as pessoas, nessa noite, começaram a pular pela janela desesperadas, caindo na própria bolha, coitadas, uma confusão.
Talvez eu tenha usado a técnica de forma errada, e ela começou a perder o efeito. Resolvi, na noite passada, tentar a técnica mais universal de todas: Os carneirinhos.
Me disseram que temos que visualizar os carneirinhos pulando a cerca de diferentes formas, pra não viciar o cérebro. Fiz o teste. Imaginei uma fila enoooooorme de carneirinhos brancos, todos aguardando a sua vez de pular a cerca. Veio o primeiro: Yupi! Pulou. Veio o seguno, pulou de costas. “O próximo” eu indicava que era a vez do outro, que deu uma pirueta no ar, e caiu de mal jeito. Lembrei daquele grupo de “puladores” que vivem por aí, pulando prédios, casas, barras, não sei, vi uma reportagem esses dias no GNT, pensei neles, e em quanto eu também sou malabarista no meu dia a dia, nossa, no meu trabalho, na minha vida, lembra aquela vez que... Pronto, devem ter se passado séculos, eu tinha me esquecido das puladas, e ainda estava desperta. Voltei aos carneirinhos, eles estavam emburrados: “Pô, bem na minha vez você mudou o pensamento??” Reclamou o que, agora, era o primeiro da fila. Olhei a longa linha e eles estavam todos emburrados. Eu tinha esquecido os pobrezinhos enquanto viajava nos skatistas. Eu disse skatistas?? “Eeeeeei, voltaaa!”. Eles fizeram um coro me chamando antes que eu os deixasse de novo. Um coro da voz dos carneiros, isso não pode ser normal. “Que carneirinhos abusados!” Eu pensei calada. Resolvi que tinha que baixar a bola deles e por alguém para que eles respeitassem, senão, iam se voltar contra mim e eram uma multidão de carneiros! Instalei ali, ao lado da fila, um enorme lobo-mau. Segurando um cajado ele daria as ordens: “Ei pessoal, o negócio é o seguinte, um por vez e só quando eu chamar. Trata de fazer diferente do colega da frente, hein?! E nada de reclamações! Quem manda aqui agora sou eu!” Pronto. Agora sim ia funcionar. Eles voltaram a pular, cada um pulava de um jeito enquanto o lobo ia gritando: “Próximo, próximo, próximo”. Resolvi olhar pra onde eles iam depois de pular. Não consegui ver, mas fiquei curiosa. Tinham uns que faziam pulos excepcionais, umas piruetas, como aquela menina do pan, aquela ginasta. Isso, eles deveriam estar no Pan, esses danados. Mas pra onde iam? Será que eles voltava para o fim da fila? A fila nunca acabava, coitados! O lobo achou ruim comigo: “Ei madame, a senhora vai ficar dispersando e me deixando de lado, ou vai assistir diretinho aqui o nosso trabalho???” Tentei me concentrar, mas, de repente, pensei: “Poxa, até o lobo?” Não é possível, eu tenho que obedecer até os meus próprios monstros?? Vou exercer a hierarquia aqui, pelo menos dentro de mim, oras! Olhei bem para o lobo, para os carneiros, todos estavam virados para mim, olhos assustados. Eu os peguei com cuidado, todos de uma vez, e inseri numa bolha. Deixei todo mundo se debatendo lá, dentro da bolha, enquanto ela saia pela janela do meu quarto, devagar, até sumir no céu de São Paulo, bem quando eu adormeci.

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