Saturday, May 16, 2009

Do baú

Escrevi isso em 2003. E me surpreendo de ver como eu era corajosa...

12/09/2003
Medos
Eu tenho medos. Isso mesmo, no plural: medos.
Talvez, fique mais claro se eu escrever assim: MEDOS. São muitos e são grandes.
Ocupam espaços enormes dentro de mim. Espaços que deveriam estar preenchidos com
amor, estão lotados de medos.
Os medos travam os lugares para que ali, não entre nada. Os medos agem como se
houvesse dentro de mim, espaços confinados, escuros, desertos. Só as infinitas
possibilidades que o medo cria é que podem adentrar essas portas...
São milhares de medos, de todas as cores e formas, alguns, indizíveis até.
Além dos normais, os proibidos. Além dos banais, os ridículos.
Tenho medo de bichos pequenos, tenho medo de ralo entupido, tenho medo de
trovão, medo de gente muito alta e mais medo ainda de anão.
Tenho medo de lugares desconhecidos, tenho medo de altura, mas o medo maior é do chão.
Tenho medo de luz muito forte, medo de ficar gorda, medo de ficar velha, medo de
ficar sozinha, medo de ficar - para todo o sempre - acompanhada.
Tenho medo de tropeçar na frente de todo mundo, medo de gaguejar na hora da
apresentação, de cuspir o chiclete sem querer, de babar no sofá dos outros, de
chorar sem saber porquê.
Tenho medo de blecaute, medo de assalto, medo de dor-de-dente, medo de dor de
gente também.
Tenho medo de nunca entender, medo de sonhar alto. Mas tenho medo
de deixar de sonhar, de ser real.
Tenho medo de viver acordada para sempre.
Como posso ter tanto medo de morrer, se me apavoro tanto quando penso em viver?
Tenho medos estranhos... Medo de ficar maluca e medo de manter-me sempre lúcida.
Medo de frio e medo do fogo.
Os medos esdrúxulos também me acompanham. E se a minha língua crescer e, ficar dependurada para fora, enorme? E se eu achar um corpo no porta-malas, e todo mundo disser que fui em quem matei? E se tiver sido, mesmo?
Tenho medo ver um anjo no teto do quarto ou de morar um demônio debaixo da cama.
Medo de gente famosa, medo de gente bonita, medo de gente grande, em geral.
Tenho medo de polícia, medo de doença, medo de terremoto e de atentado
terrorista. Tenho medo que alguém morra, tenho medo que todo mundo morra, tenho
medo de nunca morrer, mas muito, muito, muito mais medo, de morrer um dia, ou
então de matar alguém - mas eu não esconderia o corpo no porta-malas.
Tenho medo de gostar, e medo de não ser gostada. Tremo de pavor quando penso que
talvez, posso gostar e ser igualmente gostada, para sempre.
Como será a penitência de uma paixão correspondida?
Tenho medo da solidão, medo do escuro, medo das sombras... Medo do fracasso e
medo do sucesso. Medo de ficar muito, muito, muito pobre e um medo igual de
ficar muito, muito, muito rica.
Fora o medo do telefone tocar e de não tocar. O medo da internet falhar, o medo
da tv apagar, de todas as luzes apagarem, de todos os sons se calarem... Fora o
medo que tenho de mim, e o medo que tenho do medo.

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