Eu era uma jovem solteira, talvez de 25 anos, quando aconteceu. Estávamos no shopping, 4 amigas sentadas no confortável sofá de uma joalheria. A vendedora mostrava brincos, colares, todos lindos, caros e irresistíveis. As amigas, meio tolas, começaram a se incentivar a cometer ali uma pequena loucura, que seria comprar um dos itens em mais prestações do que caberiam nas nossas vidas, e olha que éramos todas jovens.
Uma topou a outra também, uma decidira que não e a última, uma doce menina recém casada, estava titubeado. Quando insisti, dizendo que ela trabalhava tanto e, portanto, deveria ter direito a esse mimo, ela confessou, acanhada: “É que meu marido vai me matar se eu gastar esse dinheiro todo”. Eu tive um instante de choque. Indignei-me absurdamente e, se tivesse um palanque ali eu subiria e faria uma fogueira de sutiens: “Como assim, amiga? Teu marido vai achar ruim, tá louca?! É teu dinheiro, você rala a beça no seu trabalho, não tem que dar satisfação não, que que é isso mulé, ficou boba, foi??” eu ia discursando minhas palavras lindas e idealistas, quando uma outra, mais sensata, tentou me acalmar: “Mas calma, ela é que tem que saber como é com o marido dela...”. Eu calei-me, fiz a minha comprinha, e fui-me embora indignada. Saí de lá bufando. Onde é que já se viu, obedecer a marido, dar satisfação das próprias economias, minhas amiga só poderia ter perdido o juízo de vez, claro. Eu nunca, nunquinha na vida que iria me submeter dessa maneira, preferiria a morte a ter que dar satisfação de cada colarzinho que eu comprasse, imagine só que absurdo, etc, etc, etc...
Pois voou o tempo. Eu fiz 26, 27, nem me lembro dos 28, 29 e pronto, cheguei aos 30, casei-me e desci de vez do palanque, sem nem notar.
Foi ontem, no shopping, quando comprei dois sapatos e saí da loja apreensiva, pensando como iria me explicar ao meu marido, que me lembrei da antiga joalheria e da minha pobre amiga. Eu, a independente, a fodona, a dona do meu nariz, me tornara uma delas. Não sei quando foi. Não sei se foi no dia que ele reclamou do meu cartão, ou quando eu deixei de contribuir para a nossa poupança, ou se foi quando eu comentei, por cima, do meu cheque especial. Mas em algum momento no nosso casamento, eu dei a ele o direito de reclamar das minhas compras. Eu dei a ele, de bandeja, o direito de reclamar caso eu comprasse um colarzinho ou – pior – um sapato. É um fenômeno que eu não sei explicar bem. Talvez haja um mosquito, ainda desconhecido dos cientistas, que pica as mulheres casadas e causem essa reação. As mulheres passam a esconder as compras, mentir os gastos ou diminuí-los, em nome da boa convivência no lar. E eu faço isso. Faço porque escolhi compartilhar uma vida ao lado de alguém e isso implica em compartilhar dinheiro, economia e escolhas. É difícil dosá-las, é difícil estabelecer os limites. A gente tenta aqui, erra acolá, mas segue fazendo como pode, como sabe.
Ontem, quando estacionei o carro na garagem, escolhi deixar a sacola com meus sapatos novos lá mesmo, subi de mãos vazias e beijei meu amorzinho. Quando ele entrou no banho, no entanto, como uma adúltera que vai encontrar seu amante, desci correndo pra garagem, peguei a sacola nova, subi também correndo, entrei em casa de forma sorrateira e joguei no fundo do armário, sem deixar nenhum rastro do meu crime, meus novos e lindos escarpans. Errado ou certo, eu, como todas as outras, o fiz em nome da boa convivência no lar. Até porque, isso sim é artigo de luxo, raríssimo, valioso e necessário, para sermos simplesmente felizes. Ainda que tolos, felizes.
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8 comments:
Aninha, achei demais oq vc diz no fim do texto, que a boa convivência no lar é atigo valioso. Também compartilho da sua opinião. Estou nos 28, solteira, mas já tenho em mim uma cicatriz do mosquito que me picou: gosto de dar satisfações. Mas, claro, dar satisfação aos pais é diferente de dar satisfação a marido. Por isso, eu faria a mesma coisa que vc, esconderia os sapatos com aquela sensaçãozinha gostosa de que não deixou nenhum rastro, como uma agente do FBI disfarçada, hahaha...
E, um dia, quando ele notasse o sapato, eu diria: Ah, já tava guardado aí há um tempo, mas eu deixei pra usar só hoje!
Hihihihi...La femme Nikita!!!
Beijocas doces cristalizadas!!! :o*
Ana, pois aqui em casa acontece justamente o contrário! rs.
Sou eu que fico vistoriando e dosando as contas dele... eu compro pouquíssimo, apenas o suficiente e olhe lá!!! Acho que porque passei tanta dificuldade por causa de grana, que agora só compro o essencial.
Tenho planilha de controle de custos e tudo e fico tentando fazê-lo me acompanhar também. Se não economizarmos quando compraremos nossa casa? É minha justificativa.
Olha, amiga, estar do outro lado também não é nada agradável, viu?! Me sinto a própria megera controladora fazendo isto... mas eu sei bem o que é ficar sem grana e é pior do que aprender a controlar, pode apostar!
Beijim
Ei, e esta música "cotidiano" aí do lado? Sabia que é uma de minhas favoritas? Eu A D O R O esta música!
Kika (posso escolher este?)Adorei o teu blog!
Cris, eu também controlo os gastos do meu marido, mas não conisgo controlar os meus! E vivo inventando promoçãoes.rs E ele, que é um doce, fica me chamando de consumista.rs No fim, somos dois gastadores. E não temos casa própria.
Beijos
brava, amicá.
Hahaha! Faço igualzinho. O pior é que marido gerlamente não reclama das minhas compras, acho que eu fico é com peso na consciência, principalmente no caso dos sapatos, que apesar de ter quase cem pares, tô sempre precisando muito, muito de mais um. beijos
Lembrei da minha tia agora... quando meu tio reclamava de um sapato novo ela respondia que era velho e que ele não prestava atenção nela... Eu ainda tô em cima do palanque, se bem que já fiz dessas de esconder os produtos dos meus crimes da minha mãe
beijos!
Eu também sempre levantei muitas bandeiras e quando me casei fiquei bem cordeirinha...muitas amigas tb me crucificavam, falavam que a minha atitude era absurda porque o dinheiro era meu e fruto do meu trabalho...
Mas viver em paz e feliz não tem preço. Esses são pequenos delitos que valem a pena cometer e muitas vezes eles sabem das nossas "escapulidas" mas devem nos perdoar por saberem das nossas boas intenções!
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